Há semanas tenho estado do alto de tribunas virtuais (no seu antigo conceito pré-computador), colocando-me sempre contra ou a favor de alguém, ou de alguma coisa. Cansei. Essa tarefa de advogar causas indefensáveis é realmente cansativa.
Já exercer a tarefa da promotoria é mais fácil. Condenar parece-me mais prazeroso , ou os malditos “fuxicos” (ti-ti-tis) não fariam tanto sucesso.
Proponho-me, hoje, a escrever uma Crônica sobre o Amor, afinal , há muito tenho deixado de lado o mais antigo dos temas.
Como um diamante lapidado em mil faces ou uma estrela de mil pontas, o Amor fulge de mil formas.
Cabe ao poeta desenhá-lo, vivendo-o ou não. E, com delicadeza, anunciar o que vê, em si, ou em outrem.
O cronista, um voyeur inveterado, aproveita-se de um hipotético buraco de fechadura e flagra o poeta. Por sua vez, o poeta, não se sabendo observado, deixa-se flagrar.
Em razão dessa série de coincidências surge esta crônica. É o que se vê.Trata-se de uma crônica recheada de poesias ( não saberia fazê-la diferente), mas é uma crônica.
A princípio lhes apresento o amor sem par, o amor ímpar, como diria Chico Buarque, aquele amor que espera o parceiro…
Levanto cedo. Com o sol.          
Momento de ir ao jardim colher as flores.           
Ritual cotidiano.           
Uma liturgia…Uma ou duas flores.           
Mais que isto é uma sangria.           
Com elas enfeito os jarros,           
sabendo que, à noite, estarão murchas e sós.           
A casa fica linda…           
Recolho as folhas secas que estão           
sobre as cadeiras da varanda, a noite as trouxe.           
Perfeito!           
O café cheirando na chaleira.           
O pão quentinho no forno.           
Tudo pronto.           
A rede se embalança, feliz, à brisa da manhã.           
Com certeza espera alguém.           
A espera se estende além do tempo.           
O tempo escorre feito lágrimas           
dos olhos, sem pressa.           
O café desiste de cheirar.           
O pão esfria.           
A rede para, sob o escaldante sol do meio-dia.           
A noite chega, fria.           
As flores estão murchas e sós           
…e eu também. 
Quem sabe pela espera infrutífera, o poeta sente-se envolvido pela desistência:
Há um tempo para suportar,        
um limite para resistir.         
Depois de ali, o Hades,         
Depois de ali, o Nada.         
Já não se sente         
o pulsar da vida.         
Já não se acende         
o brilho do olhar.         
O des-esperar         
sufoca qualquer esperança.         
Nas mãos vazias         
nem sequer lembranças.         
No tempo interno         
apenas o inverno.         
Foi tão intensa e longa a espera         
que matou definitivamente         
a primavera. 
Mas não se esgota aí a multiplicidade amorosa. Vejamos o amor quando é pensado de mansinho:
Talvez a grande ventura seja        
olho no olho         
mão na mão         
o resto , pura ilusão.         
Ansiar por flores e cores,         
apenas ópio,         
jeito de anestesiar o ócio,         
jeito de escapar à dor,         
jeito de esconder de si         
o inevitável sufoco,         
o profundo oco onde mergulham         
outras emoções de nenhum valor.         
Olho no olho, mão na mão,         
mais nada,         
é tudo que traz         
real colorido à estrada.         
Talvez seja esta         
a única verdade. 
…nem sempre…nem sempre…o amor com gosto de vulcão também está por aí, em plena ERUPÇÃO:
Impossível esquecer:        
noite por demais estranha…         
Das que não se esquece nunca…         
Matriz do jamais vivido         
Arte em “forma-perdida”.         
No jogo do amor febril         
o toque mais atrevido.         
As ânsias em torvelinho.         
O clímax se aproximando         
e, no auge do carinho,         
de repente, um stop inesperado.         
Com infantil olhar maroto         
ele observa o efeito…         
Meio sorriso nos lábios,         
quer saber o que acontece.         
Ah! Antes não o tivesse feito…         
Um turbilhão, um espanto,         
tempestade, terremoto…         
O desejo interrompido         
transformou-se em transgressão.         
Choro, pranto, desespero,         
soluços em profusão !         
Murro…tapa…beliscão…         
O espanto mudou de lado:         
De olhos arregalados         
o sorriso perde o rumo.         
Tenta retomar o prumo…         
Agora é tarde demais!         
Inundação de emoções…         
Difícil de controlar.         
Volta a fita do começo…         
Voz mansinha, sussurrada,         
mãos afagando cabelos,         
ternura…cuidado…zelo…         
Assim se trata a criança         
de quem foi surrupiado         
o mais precioso brinquedo. 
Um esclarecimento se faz necessário: este blog não é um confessionário ou um divã de psicanalista; ele é, tão somente, e nada mais, uma vitrine de possibilidades.
O assunto é muito vasto. Provavelmente voltarei a ele…..