Recebi de uma pessoa muito especial uma fábula que preciso passar para vocês. Digo e confirmo que essa pessoa é especial e explico porque... Ela possui em si mesma uma inexplicável máquina do tempo que lhe permite ir e vir através do tempo com a mesma facilidade com que tomamos um ônibus ou um taxi. Os limites dessas viagens, até onde ou até quando, eu não tenho conhecimento.
Daí que não posso dizer se a lenda do beija-flor que ela (a pessoa em questão) me enviou lhe foi contada por ancestrais seus, ou é uma criação dela própria. Mas isso é o que menos importa.
O que consegui absorver da dita lenda é a explicação (absolutamente verossímil) do comportamento do nosso beija-flor.
Agora podemos saber porque ele age de maneira tão pouco habitual, tão inusitada.
Segue-se a lenda:
Lenda do beija-flor
Conta uma lenda indígena que um dia um bando de uirapurus – os pássaros mais canoros de toda a floresta – se reuniu para uma audiência com Tupã.
Ao chegarem na presença do deus supremo, postaram-se ao solo e um porta-voz previamente escolhido assim falou:
- Ó, Tupã nosso pai, senhor e criador de tudo que anda, rasteja, nada e voa, nos agraciastes com o mais belo canto de toda floresta, porém nossa plumagem não faz jus à beleza de nossa voz. O colorido de nossas penas pouco supera a de um reles pardal.
Neste ponto, Tupã interrompeu o porta-voz e disse;
-Todos os pássaros vos invejam os trilados longos e melodiosos, isto não vos basta? O que mais quereis?
-Ó pai, dai-nos uma plumagem esplêndida e um bico longo e elegante.
-Tens certeza do que me pedis?
-Sim, pai Tupã, é este o nosso maior desejo.
-Pois que assim seja.
De imediato a plumagem do bando descontente de uirapurus transmutou-se em uma brilhosa aquarela onde predominava o azul e o verde – alguns outros preferiram o dourado e mesmo o vermelho, mas todos se viram possuidores de bicos longos e graciosos – alguns eram curvos e outros eram retos.
Maravilhados e agradecidos a Tupã, lá se foram os uirapurus.
Logo sentiram fome, tentaram capturar os insetos de costume mas perceberam que seus novos bicos eram incômodos para a tarefa outrora tão fácil. Passaram então a se alimentar do néctar das flores.
Não lamentaram a mudança e disseram:
-Quem precisa de insetos? Agora podemos capturar o mel com nossas línguas.
Após se satisfazerem à larga, deu-lhes vontade de cantar e atrair os outros pássaros invejosos de seu canto incomparável. Mas... que decepção! De suas gargantas saía tão somente um trilado curto, inferior até mesmo à voz de um pardal.
Frustrados, foram novamente ter com Tupã.
-Pai, o que houve com nosso canto que tanta inveja causava aos nossos primos?
Tupã irritado limitou-se a convocar uma harpia para que os expulsasse do palácio.
Dizem que alguns desses novos pássaros – apelidados de beija-flor – vagam hoje por vários lugares à procura do canto que já não podem executar. Pousam tristonhos em quintais toda vez que ouvem música e tentam reaprender a arte perdida.
Olha aí o nosso amiguinho parado, ouvindo música.
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