quinta-feira, 28 de outubro de 2010

UMA HISTÓRIA DE AMOR



Permitam-me dividir com vocês algo inusitado, e absolutamente não desejado, que me aconteceu.

Fui adotada por um magnífico espécime de gato Siamês, com tudo que ele possui de belo e nobre.
Apareceu em meu jardim, e , em desespero de causa, avançou sobre a comida de Ninja, minha tartaruga, que por sinal se alimenta, entre outras coisas, de ração de gatos.... Magro, abatido,com olhar de "cão" abandonado, demonstrava estar perdido ou rejeitado.

O susto não me impediu de concluir: Ele precisa de ajuda!

Quem poderia negar o pedido expresso naqueles olhos tão meigos, de um azul profundo e misterioso?

Imediatamente o servi com farta porção do alimento em questão...e Ninja nem reclamou!

Pensei que a história acabaria aí. Infundado engano! Após comer com avidez, o lindinho ficou a me olhar. Eu estava quase conquistada...
Dia seguinte, ao acordar, como de hábito, fui ao jardim colher algumas flores.
Quem estava lá? O olhar!
Não satisfeito, Ele, o gato, veio ao meu encontro e, num gesto da mais absoluta sedução, ronronando uma melodia encantadora, enroscou-se em meus pés, acabando de me conquistar definitivamente!

Passados poucos dias já percebo que toda aquela encenação tinha um único objetivo: granjear o meu afeto.

Não sou volúvel nem inconsequente...tenho pra mim que qualquer pessoa passaria pelo que eu estou passando, se pusesse os olhos sobre Ele.
Só de vê-lo coração se enternece!

No seu "rosto"(recuso-me a chamar de cara), na macia máscara de veludo marrom-café quase atingindo o negro, eu vi refulgindo duas cintilantes águas-marinhas, de extraordinário azul transparente que nos conquista pela serenidade e delicadeza com que nos enfoca.
Creio que ali estava a mais rara combinação que a natureza poderia criar: um moreno acentuado envolvendo dois profundos olhos azuis! Haja coração!

A pisada solene, os movimentos lentos e estudados, lhe conferem nobreza somente comparável à dos felinos selvagens!

"Hoje Ele mora em minha aldeia [casa] comigo" (F. Pessoa)...Vive em constante meditação. Faz do silêncio seu ambiente. Sobre a almofada, dorme bastante...mas adora ficar pensativo, piscando lentamente os olhos sedutores.
Vez em quando levanta e vem conferir se ainda continuo sob o seu domínio...enrosca-se em minhas pernas, emite uma canção quase inaudível, olha nos meus olhos... e volta à preguiça, própria da sua espécie.


Os corriqueiros ruídos do funcionamento da casa não o perturbam. Ainda não sei se gosta de música. Observo-o. Quero muito que Ele seja feliz aqui.


O inesperado bateu à minha porta e eu abri sem restrições.
Acho que Ele veio substituir o Beija-Flor que se evadiu depois de dois anos de convivência afetiva. Prefiro acreditar que ele morreu...do que admitir que ele me abandonou.


Em nova (a)ventura...seja lá o que Deus quiser!

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Chilenos... eles sobreviveram!

Ainda somos humanos!... é a grande inferência.

Todos os prognósticos eram adversos porque o diagnóstico era aterrador.

As circunstâncias se acumulavam e se equilibravam numa fragilidade de castelo de cartas prestes a desmoronar definitivamente.

O assombro externo só encontrava similaridade ao provável estado de estupor dos principais personagens do drama acontecendo e da tragédia que se prenunciava.

O ineditismo do acontecimento não permitia previsões nem contra nem a favor. Mas as dúvidas eram avassaladoramente dominantes. As ameaças reais e imaginárias eram tais que poderiam paralisar e engessar a movimentação e a criatividade geradoras de solução. Um túmulo a quase 700 metros de profundidade era o desafio que se revelava como um problema a ser resolvido, numa atitude (quase) acima da capacidade humana. Em luta contra o tempo, a altura de um prédio de 220 andares deveria ser vencida para que o resgate acontecesse.

A cada momento as dificuldades iam-se revelando...e as dúvidas se concretizando.

Era necessária a perfuração...e o que seria encontrado?

Rochas indevassáveis, ou frágeis, além da conta?

Lençóis freáticos com  possibilidade de inundação?

Exalação de gases subterrâneos contaminando o ar já pouco saudável, no qual o oxigênio e a temperatura adequados teriam que ser manipulados e conseguidos  através  do conhecimento técnico da equipe de salvação?

As dificuldades eram tantas que ultrapassam o quase absoluto desconhecimento de quem lhes escreve, neste momento. Desisto de enfocar esses problemas uma vez que poderia derramar sobre aqueles que me leem um monte de palavras insensatas e bobas. Sou apenas uma escriba ignorante e emocionada. Dois atributos que não me conferem validade.

E aqui fico a louvar, admirar e bendizer os resultados obtidos pela equipe de salvação em todas as etapas  do processo.

Mas, perdoem-me, não poderia deixar passar em branco o sentimento que me dominou e me dominará por longo tempo, creio mesmo que por todo o meusempre(tão limitado!) - Sinto-me honrada em fazer parte da comunidade humana! Se sou semelhante àqueles homens  que puderam conviver em condições não somente adversas, mas aterrorizantes.

Temos certeza que, nos primeiros 17 dias, a falta de perspectivas era a cegueira dominante àquele desafortunado grupo. Nada viam... nada sabiam... nada esperavam, talvez. E, no entanto não se encaminharam para a selvageria, para o desespero, para o desequilíbrio da certeza do desfecho trágico... "É impossível não ficar louco aqui dentro..." escreveu um deles. Contudo eles conseguiram conservar a lucidez.

Eles esperavam... e construiam, dentro de suas limitadíssimas possibilidades, o que lhes era permitido, para conservar e fazer crescer a sua própria hominização. Alguém já definiu: "...palavra que nenhum animal faria tal coisa...somente o bicho-homem seria capaz dessa conquista!"

Eram humanos, sim , lutando para tornar coletiva, ao seu desventurado grupo, a característica marcada pela solidariedade, pela empatia, pela compaixão, pela generosidade.

Cabe-me registrar o que sinto: sou humana, faço parte dessa honrosa categoria dos seres viventes da qual faz  parte  essa fatia que o mundo inteiro admira e aplaude.

Que as consequências advindas deste acontecido não venham diminuir a glória do inédito. Que o uso dos fatos não atinja o nível do abuso...em quiasquer dos vícios (econômicos, políticos, empresariais , midiáticos...) costumeiramente  vividos por uma humanidade  tão necessitada de bons exemplos.

Bom seria aproveitarmos , ao máximo, a lição!

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Dinah, em O RETORNO

Pressionada por diversas circunstâncias estou a ponto de "voltar ao ponto de partida". Retornar à minha cidade, de onde parti há vinte anos, também desejosa de reconstruir-me em novas bases.
Quase toda a minha família já retornou, como avisou uma das minhas irmãs:
"Os elefantes se sentem obrigados a reencontrar as suas origens quando sentem a aproximação do Fim"...
Eis-me aqui, sofrendo as agruras de uma cidade que generosamente me acolheu em tempo de suaves circunstâncias, mas que a elefantíase do tráfego, o descontrole e o desrespeito às boas normas de convivência, o sumiço da afetividade sem restrições, o generoso estender de mãos acolhedoras sem exigir nada em troca está , cada vez mais, escasso.

Talvez a dificuldade esteja em minha maneira de ser, que não acompanhou as mudanças que o "progresso" exige. Ou , talvez o tal "progresso" não passe de um retrocesso!
O fato é que estou voltando!

Desenraizar-me novamente.
Arrancar do chão,
como se erva daninha fosse,
todo um esquema desenhado
(ao longo de um escasso tempo),
um ambiente com carinho elaborado,
cenário onde pude construir
e construir-me no que me restava
de tempo útil e proveitoso,
inda que de produto duvidoso.

Partir de novo?
Recomeçar?
Sim, teria que recomeçar...
Partir do zero
porque não quero re-construir!
Em nada quero me apoiar...
Virar mais uma esquina do viver...
Abrir novas janelas.
Uma nova brisa respirar
para que o cheiro de mar
me venha reanimar,
um novo alento
entrar por nova porta
e um colorido novo me sorrir.

Que louca!
Que tempo haveria
para um novo presente construir?

Enfim, vale a pena tentar...E lá vamos nós em nova embarcação e por antigos mares navegar...