quarta-feira, 7 de julho de 2010

Pensamentos...em um dia chuvoso.

Durante toda a minha vida tentei, se não eliminar, pelo menos identificar as injustiças do cotidiano...e elas são tão várias! Um exemplo clássico de injustiçado é o urubu. Considerado feio, as pessoas não lhe reconhecem os méritos e nem percebem a extraordinária beleza do seu voo incomparável.E que dizer da sua função precípua de recolher e "engulir" os resíduos que todos rejeitam?

Deixem-me, hoje, dar a ele o lugar que lhe cabe, ao menos no meu analógico imaginário.

Ao Urubu

Quero trazer-te, sim,
para dentro de minh'alma.
Terás um farto banquete.
Como toda gente,
tenho cá dentro,
em recônditos espaços,
carniças que busco esconder,
sentimentos de odor insuportável
...não os quero conservar!

Vem, és tu o meu remédio.
Preciso limpar meu ego,
recuperar a infância sem temor,
sem mágoas, sem vaidades, sem rancor...
e então poder flanar contigo
em alturas memoráveis,
em viagem admirável,
em voo contemplativo
sobre o reino de além-dor...
Vendo a mim mesma
como flor que acaba de se abrir
e a ti como meu libertador.

Essa poesia me traz de volta a um acontecimento inesquecível que guardo na memória.
Certa feita, estava com um grupo amigo em conhecida praia da nossa Bahia.
Sob frondosas amendoeiras, em um rústico restaurante, fui "apresentada" a um Urubu, que passeava galhardamente pelo chão, como se fosse um galináceo qualquer. Teria caído do ninho e alguém o recolhera, cuidadosamente, e o estava criando como bichinho de estimação. Pelo visto ele adorava sua inusitada situação.
Aproximei-me, olhei-o bem nos olhos, sorri...Com certeza absoluta, ele captou toda ternura que coloquei naquele olhar...e correspondeu!
Passou a me seguir enquanto brincávamos de "O Sombra"...Eu, na frente, e Ele me acompanhando...Em questão de segundos nos tornamos um espetáculo para as pessoas em volta. Entre divertidas e espantadas elas nos olhavam impressionadas com aquele show incomum.
Mas o momento mágico teve fim, pois eu devia continuar o meu caminho, abandonando aquele afeto surgido inesperadamente...fortuito, mas profundo. Eu o deixei , sabendo que não o veria nunca mais...tal qual a amizade entre um conhecido Pequeno Príncipe e uma Raposa...ou um Aviador e o dito Pequeno Príncipe...
Fui embora,mas aquela figurinha é, hoje, um ícone no altar da minha memória afetiva. Guardo-o com carinho e faço desse Urubu um amigo e um conselheiro.

...Coisas da Vida...ou da Imaginação...

É compreensível que os Mitos, as Religiões, as Artes e a Ciência da Alma tenham conseguido rastrear e identificar essa Entidade que atua no eu-profundo dos seres humanos e da qual meu Urubu é apenas um símbolo.


Mudando de assunto.

O triste cotidiano tem invadido a minha privacidade com notícias da minha terra, as quais me deixam muito abatida. O Nordeste parece ser um "filho enjeitado" com o qual tudo pode acontecer.

Pasmo nordestino

Que enormidade de chuva
vem caindo sobre a terra.
Parece que o céu decidiu
afogar de uma só vez
todas as mágoas do mundo.
Nesse tempo desolado
onde se escondem as avezinhas
tão frágeis, tão pequeninas?

Não é só dia chuvoso,
é arremedo de dilúvio!
Um dia há que parar...
não se pode viver assim
sob ritmo tão triste,
melodia de um só tom,
suprema monotonia
...e chove...chove...chove...

Até as plantinhas dizem:
"Já chega!"
Por que tem que ser assim?
Ou sol abrasando tudo
ou a água inundando o mundo?





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