domingo, 8 de março de 2009

OITO DE MARÇO

Claro!

É justo, admissível e até esperado que uma poetisa louve-se a si mesma e às suas parceiras , em data universal.

Mas... louvar a qual mulher ?

Somos tantas, tão variáveis e tão diversas quanto os pontos e as cores de um bordado.
Na mitologia feminina uma figura se destaca:

PENÉLOPE.

A mulher-fiel, a mulher-esperança, aquela para quem vinte anos passaram com a violência e a placidez de uma tempestade que, em um certo alvorecer, chegou ao fim.

Mas...teria sido assim?

Teria ela tido paciência e perdão suficientes para escutar o relato das aventuras que lhe arrancaram seu homem por tanto tempo?

Sei não.


AS FIANDEIRAS

Tecer é aprisionar as mãos
...mas libertar os pensamentos...
É permitir que
infinitos mundos
rodopiem sob ação
de fantásticos ventos.

Viagens reais nada são
comparadas
às viagens virtuais.

Na concretude
o princípio
o meio
o fim
o limite
a fronteira
a partida
a chegada.

Na espiral da fantasia
paisagens
personagens
roteiros inimagináveis
delírio
histórias inconcebíveis
tomam forma
e, vindos da fugacidade,
vêm pousar
nos pontos e nas cores
do bordado.

E, da viagem
sem partida
e sem chegada,
suprema maravilha surge
dos dedos de Ariadne.

Por quais misteriosos mundos
voejou Penélope
no seu tece e destece?
O soubesse Ulisses
por certo a invejaria.

*************

Que homem voltou para ela?

O mesmo que partiu?

Vale lembrar que a história de Ulisses foi escrita por um homem... o que tem seu peso histórico.

Contada fosse por uma mulher, o enfoque seria outro, com certeza.


PENÉLOPE DESISTENTE

Há um tempo para suportar.
Há um limite para resistir.
Depois de ali, o Hades
Depois de ali, o Nada.

Já não se sente
o pulsar da vida.
Já não se acende
o brilho do olhar.

O des-esperar
sufoca qualquer esperança.
Nas mãos vazias
nem sequer lembranças.

No tempo interno
apenas o inverno.
Foi tão intensa e longa a espera
que matou definitivamente
a primavera.

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Darei a palavra a MIRIAM FRAGA, uma divina poetisa baiana que ousou falar por PENÉLOPE.

Sua poesia tem a força da voz na 1ª pessoa:

PENÉLOPE

Hoje desfiz o último ponto,
A trama do bordado.

No palácio deserto, ladra
o cão.

Um sibilo de flechas
Devolve-me o passado.

Com os olhos da memória
Vejo o arco
que se encurva,
A força que o distende.

Reconheço no silêncio
A paz que me faltava.
(No mármore da entrada
Agonizam os pretendentes.)

O ciclo está completo,
A espera acabada.

Quando Ulisses chegar,
A sopa estará fria.



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